Na política, há gestos que se eternizam. Outros viram meme. No caso da governadora petista do Rio Grande do Norte, Fátima Bezerra, os dois se confundem. Ao abrir uma torneira instalada em praça pública, a pedagoga e ex-senadora selou, com pompa e circunstância, a entrega simbólica de um trecho do Sistema Adutor Apodi-Mossoró. E selou também o próprio constrangimento: a cena viralizou como “a inauguração de um cano”.
A frase que acompanhou o gesto virou o selo tragicômico da ocasião: “teje entregue”, cravou a governadora, formada em pedagogia pela Universidade Federal do Rio Grande do Norte - UFRN. Palavras que, para o povo potiguar, soaram como mais um deboche do que como símbolo de entrega pública. Afinal, como pode uma professora, que chegou ao cargo mais alto do Estado, tropeçar com tanta frequência no idioma que ensinava?
A solenidade era parte de um investimento robusto: R$ 82 milhões em infraestrutura hídrica - poços, estações elevatórias, quilômetros de adutora. Tudo isso reduzido, em termos simbólicos, a uma torneira aberta num cano improvisado. Se havia, de fato, motivo técnico para comemoração, a encenação tirou o brilho da obra. E trouxe à tona uma crítica antiga, que atravessa gestões e partidos: a banalização das entregas públicas por vaidade política.
E não foi a primeira vez. No Piauí, o ex-governador Wellington Dias também virou piada ao inaugurar um semáforo em Luzilândia, no Norte do Estado. O ato foi tratado como um evento de Estado. Música, palanque e muita coreografia para anunciar o que, em tempos modernos, deveria ser serviço básico.
A esquerda nordestina, sobretudo no PT, parece ter se especializado nesse tipo de "mise-en-scène" que não engana mais ninguém. Populismo de palanque, marqueteiro de fundo e resultados tímidos. O povo vê, comenta, ri - e depois sente as consequências de um governo que ainda confunde comunicação com espetáculo.
Se o novo sistema realmente vai triplicar a oferta de água na região, como anunciado, ótimo. Mas nada disso justifica a cena digna de um sketch de humor pastelão. Em tempos de crise hídrica e desconfiança política, o povo não quer mais ver torneiras sendo abertas em praça pública. Quer ver resultado. De verdade.
Governar não é fazer teatro. E inaugurar cano, por mais simbólico que se diga, virou o retrato do vazio, do absurdo político que assola parte do Brasil.
O vereador paulistano Rubinho Nunes (UNIÃO) ironizou a cena nas redes sociais, comparando o episódio à famosa encenação do deputado Guilherme Boulos (PSOL/SP) “descobrindo uma cisterna”.
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