Em meio a um embate institucional cada vez mais acirrado entre o Supremo Tribunal Federal (STF) e setores da política conservadora, a Câmara dos Deputados decidiu nesta quinta-feira (5) conceder 127 dias de licença à deputada Carla Zambelli (PL-SP), após o STF decretar sua prisão. A medida, que adia um possível processo de cassação, lança luz sobre o delicado equilíbrio entre justiça e perseguição política no Brasil contemporâneo.
Zambelli - atualmente na Itália, onde diz buscar segurança diante da escalada de “autoritarismo judicial” - foi condenada pela mais alta Corte do país a dez anos de prisão, sob acusação de envolvimento em invasões ao sistema do Conselho Nacional de Justiça (CNJ). A defesa da parlamentar, no entanto, sustenta que ela é alvo de uma caça política, movida por suas posições firmes contra o ativismo judicial e por seu alinhamento com o ex-presidente Jair Bolsonaro.
A licença aprovada inclui sete dias para tratamento de saúde e 120 dias por interesse particular. Durante esse período, Zambelli estará formalmente afastada das funções legislativas, sem receber salário ou benefícios parlamentares. Sua vaga será ocupada temporariamente pelo suplente Coronel Tadeu (PL-SP), nome da mesma linha ideológica, o que assegura certa continuidade política à base conservadora.
Apesar da narrativa oficial de que a licença é um trâmite regimental, o gesto tem implicações políticas profundas:
Evita que a Câmara seja forçada a votar imediatamente pela cassação do mandato da deputada, o que colocaria a Casa em rota direta de colisão com o STF.
Dá a Zambelli tempo para articular sua defesa jurídica e reforçar o discurso de perseguição, já amplificado por seus apoiadores nas redes sociais.
Protege momentaneamente a própria instituição legislativa de um novo desgaste institucional, já que há um desconforto crescente com o avanço do Judiciário sobre os poderes do Congresso.
A licença não anula o processo penal nem interfere na ordem de prisão decretada pelo Supremo. No entanto, politicamente, é uma cartada estratégica: permite a Zambelli se manter como figura pública em evidência, sem ser silenciada por completo, enquanto movimenta sua base e denuncia o que chama de “criminalização da oposição”.
Para setores do Legislativo e da sociedade civil, a condenação de uma deputada federal em pleno exercício do mandato por crimes ainda controversos - em que não houve sentença com trânsito em julgado, tampouco ampla mobilização da Câmara - reacende um debate que parece estar longe de terminar: até onde vai a atuação legítima do Judiciário e onde começa a perseguição política?
A narrativa construída em torno de Carla Zambelli, mesmo fora do país e momentaneamente longe dos microfones do Congresso, continua produzindo ruído e mobilizando tanto críticas quanto solidariedade. Em um Brasil polarizado e institucionalmente tensionado, seu afastamento forçado pode acabar sendo combustível para uma causa ainda maior do que seu próprio mandato.
Mín. 22° Máx. 34°