O governador Rafael Fonteles (PT) disse o óbvio ao classificar o Porto Piauí como um “investimento de longo prazo”, em resposta às críticas da oposição. E de fato é - talvez longo até demais. A questão é que o Piauí, de direito, até pode possuir um porto marítimo. Mas de fato não tem, e, ao que tudo indica, muito dificilmente terá.
Não se trata de má vontade do governador. Como piauiense, é claro que ele deseja entregar essa obra histórica. E é compreensível que sonhe em vê-la pronta durante sua gestão. O problema é que o Porto Piauí virou uma espécie de "cantiga para boi dormir", repetida governo após governo, sempre com novas promessas e nenhum resultado prático.
A bem da verdade, o que temos hoje - sob o comando de Rafael Fonteles - é um portal, uma pequena estrutura administrativa e discursos entusiasmados. Nada além disso. E o descrédito, que ele agora tenta combater, é resultado direto de suas próprias promessas. Nos primeiros meses de 2023, o governador anunciou com alarde a inauguração do porto para dezembro daquele ano. Chegou o dia 13 de dezembro, houve "festança", mas o que se entregou, no máximo, foi o início da construção de um entreposto pesqueiro - que também não saiu do papel.
Já estamos em maio de 2025, e o Porto Piauí continua sem navios, sem canal navegável, sem operação, sem porto. Fonteles agora recua e afirma que se trata de um investimento de décadas. Pode ser. Mas é difícil convencer uma população cansada quando se repete a mesma ladainha iniciada ainda no período imperial, com recursos sendo despejados desde então e nada - absolutamente nada - funcionando.
A única estrutura realmente visível é o famoso "molhe", o paredão de pedras construído na gestão de Alberto Tavares e Silva, que, ironicamente, seria impossível de erguer nos dias atuais, dadas as barreiras ambientais e jurídicas. E o que veio depois disso? Quase meio bilhão de reais investidos por governos anteriores, um processo judicial ainda em tramitação, e nenhuma estrutura funcional para atracação ou operação de carga.
A mais recente promessa gira em torno de um canal que teria recebido cerca de R$ 100 milhões, permitindo, supostamente, a navegação de embarcações com calado de 5 metros na maré baixa e 7,5 metros na alta. No entanto, um navio de porte médio precisa de no mínimo 11,5 metros de calado. Em comparação, o Porto do Pecém (CE) opera com 15,5 metros, enquanto a profundidade do de Porto de Itaqui (MA), é de 16,5 metros.
Logo, o Porto Piauí - se um dia vier a operar - servirá apenas para atracar barquinhos de pesca, e olhe lá!
A pergunta, portanto, é inevitável: tudo isso vai custar quanto? Quanto mais? E quem vai pagar essa conta? A população piauiense? O Brasil? As gerações futuras?
Fonteles e sua equipe garantem que o Ministério de Portos e Aeroportos e técnicos da Marinha estariam “animados com o ritmo acelerado das obras”. Mas estão cientes da limitação do calado? Conhecem os desafios técnicos e de mercado que inviabilizam a atracação de grandes navios? Ou estamos apenas alimentando, mais uma vez, um sonho crônico e tecnicamente inviável?
O governador quer transformar o Piauí num polo logístico e industrial - e isso é louvável. Mas entre o desejo e a realidade, há um oceano de dúvidas, lacunas técnicas e promessas descumpridas. O Porto Piauí continua sendo uma utopia cara, repleta de placas, eventos e discursos, mas vazia de navios, operações e credibilidade.
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