O Partido dos Trabalhadores (PT), historicamente defensor das causas sociais e das minorias, se viu mais uma vez no centro de uma crise ética e jurídica. Em sessão unânime, o Tribunal Regional Eleitoral do Piauí (TRE-PI) desaprovou as contas do Diretório Estadual do partido referentes às eleições de 2022. O motivo? Uma série de irregularidades graves na aplicação de quase R$ 1 milhão em recursos públicos oriundos do Fundo Partidário - incluindo a falha em destinar a verba mínima obrigatória para candidaturas de pessoas negras, exigência prevista em lei.
Sim, o partido que cobra dos outros o respeito à diversidade racial e à inclusão falhou, justamente, em cumprir aquilo que defende no discurso. É mais do que uma contradição. É uma afronta à confiança de seus eleitores e aos princípios democráticos que diz representar.
Os números não mentem
O parecer técnico do Núcleo de Assistência e Apoio às Prestações de Contas do TRE-PI (NAAPC), amparado por relatório do Tribunal de Contas do Estado (TCE/PI), identificou um rombo de R$ 980.715,21, correspondente a mais da metade (52,48%) de todas as receitas arrecadadas pelo partido. Dentre os principais problemas apontados:
Atraso na entrega dos relatórios financeiros de campanha, envolvendo R$ 894.615,21;
Ausência de registro de receitas no valor de R$ 53.750,00;
Utilização de recursos de origem não identificada;
Descumprimento da cota mínima para candidaturas de pessoas negras, como determina a legislação eleitoral.
O relator do processo, desembargador Ricardo Gentil Eulálio Dantas, foi categórico ao destacar que tais falhas são suficientes para justificar a desaprovação das contas.
Consequências e contradições
O TRE/PI determinou ainda que o PT devolva R$ 18.600,00 ao Tesouro Nacional e que, nas próximas eleições, seja obrigatoriamente reservado o valor de R$ 17.917,15 para candidatos negros - uma tentativa de corrigir o erro, mas que levanta uma pergunta incômoda: como o partido que tanto se diz comprometido com a igualdade racial pôde negligenciar justamente esse repasse?
Mais do que erro técnico, essa omissão expõe um abismo entre o discurso público e a prática interna do partido. Enquanto o PT aponta o dedo para adversários e prega diversidade nos palanques, falha em garantir o mínimo de representatividade racial em suas campanhas estaduais. Quem se beneficiou com os recursos que deveriam estar nas mãos desses candidatos? Essa é uma resposta que a sociedade merece.
O que esperar daqui para frente?
A decisão do TRE/PI gera impacto direto não só na imagem do partido, mas também na confiabilidade do processo eleitoral. O caso deve acender alertas em outras unidades estaduais e abrir caminho para investigações mais rígidas por parte da Justiça Eleitoral.
A verdade é que, quando se trata de dinheiro público, não basta levantar bandeiras. É preciso coerência, responsabilidade e, acima de tudo, transparência. A democracia exige mais do que boas intenções - ela exige prática alinhada ao discurso.
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