Que o Piauí é um dos Estados mais pobres da Federação, disso ninguém duvida. O que ainda causa espanto é quando essa realidade crua vira motivo de comemoração institucional. A recente divulgação da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua (PNAD), feita pelo IBGE, revela que o Piauí tem a maior proporção de beneficiários de programas sociais do país: 16,8% da população. É o índice mais alto do Brasil, à frente de estados como Bahia e Alagoas.
Não há, evidentemente, qualquer demérito em ser beneficiário de um programa social. Esses mecanismos são, por essência, emergenciais e provisórios - criados para garantir dignidade básica a quem está em situação de vulnerabilidade. O problema está quando a exceção se torna a regra, e o paliativo vira política permanente. Em outras palavras, quando o Estado se contenta com a dependência, em vez de construir oportunidades para superá-la.
Mais de 590 mil famílias piauienses estão no Bolsa Família. O valor médio do benefício é de R$ 667,91, com um investimento federal que ultrapassa R$ 394 milhões por mês. Há ainda os acréscimos do Benefício Primeira Infância, pagos a mais de 222 mil crianças de até seis anos, e adicionais para gestantes, adolescentes, nutrizes, famílias em situação de rua, indígenas, quilombolas e até resgatados de trabalho análogo ao escravo.
Esses números, em vez de serem apenas exaltados como prova de “eficiência social”, deveriam servir como um alerta grave para as autoridades. Afinal, como é possível que quase 17% da população de um estado dependa exclusivamente da ajuda governamental para sobreviver? Esse dado não pode ser lido isoladamente, mas como reflexo de um modelo fracassado, que não gera emprego, nem renda, nem esperança.
Mais preocupante ainda é o ciclo vicioso criado por essa lógica. Muitos beneficiários acabam não se inserindo no mercado de trabalho por medo de perder o benefício, pois o atual formato pune a ascensão social em vez de promovê-la. O resultado é uma população cativa de um sistema que, ao invés de libertar, aprisiona - uma dependência disfarçada de proteção.
Por que o governo federal, junto aos Estados e municípios, não implementa um modelo de transição, em que o cidadão continue recebendo o benefício por um período (seis meses, um ano) mesmo após conseguir um emprego formal? Por que não se investe em capacitação profissional, empreendedorismo de base ou estímulo à produção rural e artesanal, sobretudo em regiões interioranas com forte vocação econômica?
A resposta pode ser incômoda: manter uma massa dependente do assistencialismo é, muitas vezes, politicamente conveniente. Um eleitorado fragilizado, que enxerga no Estado sua única tábua de salvação, torna-se mais vulnerável à manipulação e ao populismo.
É chegada a hora de repensar a função dos programas sociais. Eles devem ser instrumentos de transição para a autonomia, e não armadilhas de dependência crônica. A dignidade de um povo não está apenas em receber uma transferência de renda, mas em poder escolher, produzir, crescer e sonhar com liberdade econômica.
Enquanto o Piauí for líder em dependência social, será difícil festejar qualquer avanço real. A missão agora não é apenas proteger, mas libertar - com oportunidades, educação e trabalho. E isso, infelizmente, ainda está longe de acontecer.
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