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Trump x Powell: entre tarifas e juros, o que os dados realmente dizem sobre a economia americana

Enquanto o presidente pressiona por cortes nos juros e celebra ganhos com tarifas, o Fed mantém posição cautelosa diante dos riscos inflacionários. Dados revelam um cenário mais complexo do que o embate político sugere

17/04/2025 às 10h17
Por: Douglas Ferreira
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Assim com Lula, Trump também pressiona presidente do BC americano - Foto: Reprodução
Assim com Lula, Trump também pressiona presidente do BC americano - Foto: Reprodução

A recente troca de farpas entre Donald Trump e o presidente do Federal Reserve, Jerome Powell, reacendeu uma tensão antiga entre política fiscal e política monetária nos Estados Unidos. Enquanto Trump afirma que o país está “enriquecendo com as tarifas”, Powell mantém cautela e indica que os juros continuarão altos diante de pressões inflacionárias. Mas, para além das declarações inflamadas, o que mostram os dados?

O impacto real das tarifas

As tarifas adotadas ou reforçadas por Trump nos últimos meses — especialmente sobre produtos chineses e setores estratégicos como o aço — são parte de uma agenda protecionista que ele tenta consolidar como bandeira eleitoral. O ex-presidente sustenta que os EUA estão “ganhando” com as tarifas, já que a arrecadação com tributos de importação aumentou e algumas cadeias produtivas nacionais foram reativadas.

No entanto, economistas apontam que esse ganho fiscal não é isento de custos. Parte significativa dessas tarifas é repassada aos consumidores na forma de preços mais altos, especialmente em setores como eletrônicos, alimentos processados e insumos industriais. Relatórios do Fed e de consultorias privadas indicam que a inflação subjacente — que exclui preços voláteis como energia e alimentos — segue pressionada.

Inflação e juros: o dilema do Fed

A resposta de Powell tem sido previsível, dentro do mandato do Federal Reserve: estabilidade de preços e pleno emprego. Diante da perspectiva de que as tarifas possam reaquecer a inflação, o presidente do Fed sinalizou a manutenção das taxas de juros no patamar atual. Na prática, a autoridade monetária quer evitar uma espiral inflacionária alimentada pelo encarecimento de produtos importados e pelo aumento da demanda interna em ano eleitoral.

O último relatório do Fed projeta uma inflação temporariamente mais alta, em função de medidas fiscais expansionistas e da política comercial. A reação de Trump foi imediata: chamou o relatório de “desastre” e voltou a pressionar por cortes nos juros, criticando Powell como “atrasado e errado”.

Quem está com a razão?

Do ponto de vista técnico, ambas as posições têm fundamentos — ainda que seus porta-vozes estejam em lados opostos do espectro político.

Trump aposta na expansão fiscal como motor de crescimento, mesmo sob risco inflacionário. A economia americana, de fato, mostrou resiliência nos últimos trimestres, com crescimento do PIB e queda do desemprego. Mas parte desse desempenho foi sustentada por consumo incentivado, que pode se tornar insustentável se os juros permanecerem elevados por muito tempo.

Já Powell atua dentro de uma lógica ortodoxa: controlar a inflação antes que ela desancore expectativas. Com a experiência dos anos 70 ainda fresca na memória do Fed, a cautela em relação ao afrouxamento monetário é compreensível — especialmente quando há dúvidas sobre os impactos duradouros das tarifas.

E os preços, estão mesmo caindo?

Trump citou que “até os ovos” estão mais baratos. A afirmação, porém, é apenas parcialmente verdadeira. O índice de preços ao consumidor (CPI) registrou desaceleração em alguns segmentos nos últimos meses, como combustíveis e carnes. No entanto, o núcleo da inflação segue em patamar elevado, sobretudo em serviços e habitação.

Ou seja: alguns preços recuaram pontualmente, mas a inflação estrutural permanece presente — reforçando o argumento do Fed.

O que esperar desse embate

A tensão entre Powell e Trump não deve cessar tão cedo. A pressão política sobre o Fed deve aumentar. Powell, por sua vez, parece disposto a manter a independência institucional do banco central, mesmo diante das críticas.

Em resumo, não há solução simples. Tarifas geram receita e podem proteger indústrias locais, mas têm custo inflacionário. Juros altos combatem a inflação, mas esfriam o crescimento. No meio desse cabo de guerra, está a economia real — que, ao fim, será a verdadeira medida de quem estava certo.

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