A professora, pesquisadora e arqueóloga Niède Guidon era o tipo de figura que não passava despercebida: ou se amava, ou se odiava. Mas uma coisa ninguém ousa negar - ela era uma líder nata. Dona de personalidade forte e de uma obstinação implacável, Guidon foi responsável por colocar o Brasil, e especialmente o Piauí, no mapa mundial da arqueologia. Sua morte, nesta quarta-feira (4), reacende uma discussão: por que demoramos tanto a reconhecer, de fato, aqueles que lutam incansavelmente pelo país?
O prefeito de São Raimundo Nonato, Rogério Castro, parece não querer repetir esse erro. Propôs a mudança do nome do Aeroporto Internacional Serra da Capivara para Aeroporto Internacional Doutora Niède Guidon. A justificativa? Simples e contundente: se existe uma pessoa que merece ter seu nome eternizado em um dos principais portões de entrada da cidade, é ela.
A homenagem foi encaminhada à Assembleia Legislativa do Piauí (Alepi) pelo deputado estadual Gil Carlos. Agora, cabe aos parlamentares aprovarem ou não o reconhecimento. A pergunta que se impõe é: alguém mais merece? O aeroporto, aliás, só existe porque Niède brigou por décadas para que o Brasil olhasse com a devida seriedade o parque arqueológico que guarda os vestígios mais antigos da ocupação humana nas Américas.
Niède Guidon é Doutora Honoris Causa pela Universidade Federal do Piauí e, em vida, teve a rara honra de batizar uma nova espécie de pássaro da caatinga: o Sakesphoroides niedeguidonae. Mas, para além dos títulos acadêmicos e das descobertas científicas, Guidon era, acima de tudo, uma militante da ciência e da preservação cultural. Enfrentou governos, falta de recursos, negligência do Estado e a indiferença de uma sociedade que ainda prefere o imediatismo do consumo ao legado da memória.
A troca do nome do aeroporto é simbólica, mas poderosa. Não se trata de um mero gesto político. É um acerto de contas com a história. É reconhecer, mesmo que tardiamente, que o Brasil ainda tem dívida com seus verdadeiros heróis - os que constroem e preservam, e não os que aparecem apenas para inaugurar.
Se Niède Guidon não é nome de aeroporto, quem seria? Essa é a pergunta que o Piauí precisa se fazer. E o Brasil também.
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