O governo federal vem promovendo a chamada reforma do setor elétrico, defendida como avanço para a ampliação da Tarifa Social e maior abertura do mercado livre para pequenos consumidores. No entanto, a iniciativa encontrou forte resistência no setor produtivo, especialmente na indústria, que vê com preocupação a possibilidade de arcar com o aumento de custos gerado pelas mudanças.
O presidente da Confederação Nacional da Indústria (CNI), Antonio Ricardo Alvarez Alban, foi direto ao ponto: “Não aceitaremos pagar essa conta”. A crítica foi feita durante o evento em celebração ao Dia Nacional da Indústria, realizado na sede da CNI em Brasília, com presença de autoridades como o presidente do STF, Roberto Barroso, e o vice-presidente Geraldo Alckmin.
“Somos um país que produz energia barata, mas temos uma das tarifas mais caras do mundo. Isso é inaceitável. Não podemos aceitar que a reforma leve a mais custos para quem produz e gera emprego”, afirmou Alban, ao comentar a Medida Provisória assinada pelo presidente Lula no último dia 21 de maio, que dá início à nova estrutura regulatória do setor elétrico.
A Medida Provisória assinada por Lula visa ampliar o acesso à Tarifa Social de Energia e acelerar a abertura do mercado livre de energia para consumidores de baixa tensão (como pequenas empresas e residências). Na teoria, a reforma pretende democratizar o setor e incentivar a competitividade. Na prática, porém, o custo da transição pode ser transferido para os grandes consumidores — entre eles, o setor industrial.
Segundo a CNI, o risco é de que as medidas, mesmo bem-intencionadas, acabem sendo financiadas pela indústria, que já lida com um dos custos energéticos mais altos do planeta. A entidade teme que o custo da universalização dos benefícios acabe socializando prejuízos entre quem consome mais — ou seja, o setor produtivo.
Além dos aspectos técnicos da reforma, o presidente da CNI criticou duramente a falta de diálogo entre o governo e os setores afetados. Alban afirmou que as decisões estão sendo tomadas de forma unilateral pelo Executivo, Legislativo e até pelo Judiciário, sem ouvir quem produz.
“Essas decisões impõem mais encargos, mais obrigações e podem comprometer o desenvolvimento industrial brasileiro”, afirmou. Ele citou ainda que essa lógica tem se repetido em outros temas sensíveis para o setor, como a proposta de redução da jornada de trabalho.
Alban também alertou para os impactos econômicos caso avance a PEC 8/2025, que propõe o fim da escala 6x1 (seis dias de trabalho por um de folga) e a criação da jornada 4x3 (quatro dias de trabalho e três de descanso).
A estimativa da CNI é de que essa mudança gere aumento de R$ 88 bilhões por ano apenas na indústria, e R$ 260 bilhões considerando toda a economia brasileira. “Sem ganhos reais de produtividade, essa proposta só trará prejuízos. A indústria não tem como absorver esse custo adicional”, completou.
Nem tudo, no entanto, foi crítica. A CNI celebrou o avanço no Congresso do projeto que simplifica e padroniza as regras de licenciamento ambiental. A proposta, que tramita há mais de duas décadas, promete dar mais agilidade a empreendimentos de baixo impacto e trazer segurança jurídica, uma demanda histórica da indústria.
“É uma vitória importante. Precisamos modernizar a gestão ambiental sem perder o rigor técnico. Essa proposta traz previsibilidade e confiança para quem quer investir”, destacou Alban.
A reação da CNI sintetiza o dilema vivido pelo setor produtivo no Brasil: em um país com energia barata na geração, mas cara na distribuição e repleto de encargos cruzados, qualquer mudança precisa ser calibrada com precisão.
A indústria teme que, por trás do discurso de inclusão e modernização, esteja um velho vício brasileiro: transferir a conta para quem produz, gera empregos e sustenta a economia. Como bem disse Alban: “Não há almoço grátis”. E, neste caso, a indústria avisa que não vai bancar sozinha a conta da reforma elétrica.
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