No universo de versões contraditórias que envolve a vereadora Tatiana Medeiros (PSB), sua mãe Odélia Medeiros e parte da família, a verdade parece cada vez mais enterrada sob camadas de mentiras. A nova peça-chave do escândalo é o telefone celular utilizado clandestinamente por Tatiana dentro da sala de Estado Maior, no Quartel do Comando-Geral da Polícia Militar do Piauí (QCG), onde esteve presa desde abril.
Inicialmente, a própria vereadora declarou que o celular teria sido entregue por um de seus advogados. A acusação fez com que um defensor abandonasse o caso, classificando a atitude como “antiética” e duvidando da veracidade da afirmação.
Pouco depois, a mãe da parlamentar, Maria Odélia, assumiu a responsabilidade, alegando ter levado o aparelho para que a filha pudesse entrar em contato durante crises de depressão. Mais tarde, uma nova versão surgiu: o celular teria sido entregue por uma pastora amiga da família.
Entretanto, a perícia técnica feita pela Polícia Federal desmentiu todas essas versões. O relatório aponta que o celular começou a ser usado no dia 7 de abril, data em que Tatiana recebeu visita de um advogado, fato registrado na lista de visitantes do QCG. A mãe só esteve com a vereadora nos dias 5 e 6 de abril, e portanto não poderia ter feito a entrega do aparelho no dia seguinte.
O aparelho — um iPhone 16 Pro Max, junto com um tablet — foi apreendido no dia 20 de maio. Com autorização judicial, a PF realizou a quebra de sigilo de dados e confirmou que a parlamentar estava ativa no WhatsApp desde o dia 7 de abril, trocando 1.541 mensagens com diversos interlocutores.
Agora, as especulações se voltam para Francisco Antonio de Aguiar Medeiros, que além de advogado, é também parente próximo da vereadora e atuava como seu assessor na Câmara Municipal de Teresina. A vereadora conversou com o tio sobre restituição de bens apreendidos, imposto de renda e assinatura eletrônica de documentos.
O advogado que introduz um aparelho celular em uma unidade prisional para uso de um detento comete o crime tipificado no artigo 349-A do Código Penal. A conduta consiste em ingressar, promover, intermediar, auxiliar ou facilitar a entrada de aparelho telefônico de comunicação móvel em estabelecimento prisional, sem autorização legal. A pena prevista é de detenção de três meses a um ano, além de outras possíveis sanções disciplinares ou administrativas, caso o autor seja servidor público ou profissional da advocacia.
O artigo 349-A foi incluído no Código Penal brasileiro justamente para coibir a entrada ilegal de celulares nas prisões, já que esses aparelhos são amplamente utilizados para a prática de crimes de dentro do sistema penitenciário, inclusive por membros de facções.
Quando o responsável pela entrada do aparelho é um advogado, a gravidade institucional do ato é ainda maior. Além da infração penal, ele pode responder também a um processo disciplinar na Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), podendo ser suspenso ou até excluído da profissão, dependendo da conduta e do dolo envolvido.
O presidente da OAB/PI, Raimundo Júnior, já declarou abertamente que o caso será apurado, investigado e se comprovado, o advogado infrator será devidamente responsabilizado pela Ordem.
O que mais agrava a situação de Tatiana é que, durante o período em que esteve presa, ela realizou pelo menos três chamadas de vídeo com seu companheiro, Alandilson Cardoso Passos, apontado como líder da facção criminosa Bonde dos 40 e atualmente preso em Belo Horizonte (MG). As chamadas ocorreram nos dias 7, 9 e 13 de maio.
Além do namorado, Tatiana manteve contato com assessores, advogados, familiares e outras pessoas próximas, levantando dúvidas sobre se continuava articulando politicamente de dentro da prisão — ou mesmo envolvida com atividades da facção.
Embora a Polícia Federal ainda não tenha divulgado o conteúdo completo das mensagens, fontes ligadas à investigação revelam que o foco agora está em responder a perguntas centrais:
Com quem ela falou?
O que foi dito?
Há indícios de novos crimes?
As mensagens comprometem ainda mais a vereadora no inquérito sobre financiamento eleitoral com dinheiro do crime organizado?
Se forem encontrados elementos mais graves, a prisão domiciliar concedida pela Justiça em 3 de junho poderá ser revogada, colocando Tatiana de volta em regime fechado.
Tatiana Medeiros teve a prisão domiciliar decretada pela juíza Júnia Maria Bezerra Fialho, da 1ª Zona Eleitoral de Teresina. No dia 4 de junho, seu suplente, Leôndidas Júnior (PSB), assumiu oficialmente sua cadeira na Câmara Municipal de Teresina, como determina o prazo legal após o afastamento.
Enquanto isso, o mistério sobre quem levou o celular para a cela parece secundário diante da gravidade do conteúdo revelado. O uso clandestino de aparelhos e o contato com integrantes de facção criminosa podem representar violação direta de ordens judiciais, obstrução de investigação e colaboração com organização criminosa.
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