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Estado ausente: facção ameaça prefeitura no interior do Ceará e escancara domínio do crime organizado

Enquanto o governo nega, o Comando Vermelho envia ameaças diretas à gestão municipal de Santana do Acaraú, onde o próprio prefeito já admitiu empregar membros de facções

07/05/2025 às 06h02
Por: Douglas Ferreira
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Prefeito Francisco das Chagas Mendes, o “Meu Deus” disse que trabalha com o PCC e CV, depois negou - Foto: Reprodução
Prefeito Francisco das Chagas Mendes, o “Meu Deus” disse que trabalha com o PCC e CV, depois negou - Foto: Reprodução

O Estado brasileiro perdeu o controle sobre as facções criminosas, e a situação no Ceará parece ser a expressão mais contundente dessa falência institucional. Em Fortaleza, empresas de internet são expulsas de bairros por facções que, além de agredir trabalhadores e queimar veículos, assumem o controle do fornecimento do serviço. A situação chegou a tal ponto que uma das maiores empresas do Estado opera com carros descaracterizados e funcionários sem uniforme para evitar ataques.

Mas o absurdo atingiu um novo patamar em Santana do Acaraú, município a 228 km da capital, onde a prefeitura passou a ser alvo direto de ameaças de uma facção criminosa. O canal da ouvidoria - destinado a ouvir reclamações da população - foi usado para enviar mensagens exigindo o afastamento de supostos membros do Comando Vermelho (CV) contratados pela gestão municipal. Em tom ameaçador, os criminosos alertam:

“Se a Prefeitura continuar dando trampo para vermelho, a gente vai tocar o terror na cidade”.

Mensagens que chegaram ao canal de comunicação da Ouvidoria do município - Foto: Reprodução

A denúncia foi formalizada junto à Polícia Civil e ao Ministério Público, que abriu investigação. No entanto, até agora, nenhum responsável pelas ameaças foi identificado ou preso. A Secretaria de Segurança Pública do Ceará se limita a dizer que apura um "crime de ameaça", sem sinal de ação efetiva diante da gravidade do caso.

A prefeitura divulgou nota tentando minimizar os fatos, alegando que as mensagens “não foram direcionadas ao prefeito ou a seus familiares”, como se isso mudasse a gravidade da situação. Enquanto isso, a cidade vive sob a sombra da coação de facções - e de suas ligações perigosas com o poder público.

Aliás, o próprio prefeito Francisco das Chagas Mendes, conhecido como "Meu Deus", admitiu em entrevista de rádio, em 2024, que empregava pessoas ligadas ao CV e ao PCC. Segundo ele, a medida seria uma forma de “dar oportunidade” e conter a violência.

“Hoje estamos trabalhando com CV, com PCC… porque são humanos. Primeiro, eu não quero nem saber qual sigla”, afirmou "Meu Deus" ao vivo, acrescentando que “o bem venceu o mal”.

Após a repercussão, o prefeito alegou que foi “tirado de contexto” e que não compactua com facções - mesmo após declarar com todas as letras que emprega membros dessas organizações criminosas.

A situação expõe o ponto crítico em que chegou o Ceará - e o Brasil. Quando um prefeito declara, com naturalidade, que oferece cargos públicos a membros do crime organizado; quando facções mandam recado direto por canais oficiais exigindo exonerações; e quando o Estado se cala ou age timidamente, é sinal claro de que o poder paralelo já deixou de ser paralelo há muito tempo.

O governo federal não reconhece o domínio das facções. O governo estadual também não. Mas o crime não precisa de reconhecimento para exercer poder. Ele já reina - do Oiapoque ao Chuí.

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